Não era o pregão da bolsa.
Eram os feirantes e suas potentes vozes propagandeando seus produtos com seus
versinhos sacanas para as moças bonitas. Mas que feira era aquela, pois não se
viam verduras, frutas e coisas normais sendo vendidas nas barracas? A pergunta
que pairava no ar foi respondida pelos alto-falantes: é a feira moderna! Quanta
coisa linda naquela feira! As gentes chegavam aos montes para conhecê-la.
Ensaiava-se ali o que parecia ser um plano piloto para que as feiras do planeta
tomassem um novo rumo. Euforia, muita força de vontade nos braços e nas mentes,
suor e alegria eram vistos pelas brechas do futuro. Nos arredores da feira
moderna tramavam para acabar com a festa. Queriam o fim da feira moderna e de
todas as outras feiras, que virariam dias da semana sem sábado e domingo. Todos
iriam comer o que fosse plantado por eles em seus jornais, revistas e outdoors.
Cortariam os pés de música pela raiz. As folhas dos livros seriam decepadas
antes que o outono viesse colhê-las com sua mão de pelica. As telas,
esculturas, gravuras e demais plásticas não ficariam mais em pé quando lhes tirassem
do âmago o tronco de sustentação. As gentes já tinham ouvido rumores apocalípticos
na metálica viola e na voz de Pinóquio, o cego da feira. Não deram bolas.
Chegou então o dia da tomada da feira moderna. As gentes indiferentes armavam
suas barracas futurísticas para mais um dia de trabalho, cantorias e
esperanças. A feira foi tomada. Ruíam sonhos, sumiam gentes, calavam vozes, choviam
lágrimas. E assim foi durante anos. O problema - que também já tinha sido
rimado por Pinóquio -, é que aquele dia era amaldiçoado para qualquer tentativa
de guerra, só que os invasores também não lhe deram ouvidos. Um certo dia, do
nada, o tempo começou a correr para trás e parou exatamente no primeiro de
abril da profecia do cego de madeira. Um enorme buraco negro engoliu as gentes
da antiga feira moderna e os golpistas do presente que já não existia. Durante
anos, só se via um vasto sertão desértico com a cor polar do abandono. Uma árvore
começou a brotar no chão duro. Dela vieram os alicerces para a reconstrução da
feira moderna. E todo dia primeiro de abril ouve-se o murmúrio lamento e a
metálica viola do cego cantador que doou uma perna como muda para a
reconstrução do mundo.
Música do Dia: Eu no Futuro (Lula
Queiroga) (De: L. Queiroga / Lulu Oliveira).
Bicho do Dia: Bicho de Sete Cabeças.
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