... não se sabe quem foi o
primeiro a começar a correr, mas quando se deram conta, todos corriam em
disparada rumo a qualquer lugar em que tivesse mais espaço pra correr. Os
estacionamentos foram os primeiros lugares a serem invadidos. Os que ainda não
estavam correndo, - sabendo da iminência de serem contagiados pelo vírus que
ficou conhecido como “corrida sem fim” - começaram a derrubar os prédios e tudo
mais para aplainar os terrenos e transformar tudo num enorme pavimento. A Terra
continuava redonda, mas o que não era água na Terra, virou planície. Antes que
toda a humanidade fosse contaminada, já haviam destruídos todos os morros,
montes, montanhas. Everest, Alpes, Cordilheira dos Andes, tudo foi implodido e
as sobras das implosões viram material para pontes que cruzavam aos milhares de
um continente pra outro. Traçavam projetos de pontes que ligassem o planeta
como outros planetas do Sistema Solar. O último homem a começar a correr pôs o
último tijolo na inacabada ponte interplanetária. Muitos morreram nessas
construções. Os que não morreram, corriam desesperadamente sem saber pra onde. Só
corriam. Alguns tentaram parar de correr, mas foram ficando anêmicos, até
definharem e morrerem de inanição. Correr era então o alimento. Os oceanos
viraram os cemitérios onde se jogavam os pobres velhinhos que não tinha mais força
física para correr. As pessoas adquiriram métodos para copular correndo e com a
mesma rapidez dos coelhos para, assim, darem continuidade a espécie humana. Os
rebentos, antes mesmo do primeiro choro, já nasciam correndo e saiam em
disparada do meio das pernas das suas mães e raramente mãe e filho se
encontravam de novo. As mulheres só paravam de correr para parir ou para
morrer. As florestas e os outros animais terráqueos haviam desaparecido da face
plana da Terra. Entretanto, um homem que vinha na sua corrida infinda, num dado
momento, encontrou um bicho num andar vagarosamente lento que parecia uma
mistura de lesma com tartaruga. Instintivamente ele engoliu tal bicho. E parou.
Sentou no chão aliviado como se tivesse dado uma gozada resultante de uma
transa tântrica que havia durado uns 30 anos. Olhando a correria dos outros
todos pra lá e pra cá, pensou: “Puta que pariu, aonde foi que eu deixei a porra
do meu cigarro?”... Nisso acorda, sobressaltado e atrasado, um homem comum dos
tempos atuais e sai correndo para pegar um ônibus no qual nunca entraria, pois
este homem seguiria em disparada para sempre.
Música do Dia: Por um Fio (Celso
Viáfora) (C. Viáfora / Vicente Barreto).
Bicho do Dia: Avestruz (7803)
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