Pois é, os prédios hoje
aparecem do nada. Você passa na rua num dia e vê um terreno baldio, no outro já
tem um arranha-céu com porteiro e um garagem com aquela sirene chata que faz
parar teu caminhar na calçada para que um carro saia e ganhe a rua. Incrível. Parece
que e prédio tava ali invisível e que num passe de mágica tornou-se visível. Só
que quando se vê os preços dos imóveis e dos aluguéis em cidades levantadoras
de edifícios como Rio de Janeiro e São Paulo, cria-se um paradoxo: acho que até
tem gente pra morar nesse tanto de prédio, mas será que tem tanta gente assim
com grana pra morar nesse tanto de prédio? Não creio, não. É uma puta grana que
se deixa por mês por uns míseros metros quadrados com vista para sovaco do vizinho
do edifício da frente com uma trilha sonora de arrotos, peidos e cusparadas do
vizinho do lado, visto que as paredes divisórias tem alma de compensado, embora
pareçam outra coisa. A euforia dos cambistas com ingressos para partidas de
futebol é equivalente a dos especuladores imobiliários com seus apartamentos e
prédios. Eles têm o poder de impor o chamado preço artificial para os seu bens.
Enquanto isso, os bem menos abastados vão se apropriando dos terrenos
abandonados das prefeituras para construírem suas casas e terem o mínimo de
dignidade para viverem. Na vida real alguns desses lugares “pegam fogo”, são
destruídos sob os protestos dos moradores que são expulsos pela polícia ou por
alguma devastadora força da natureza. Na literatura temos a invasão do Morro do
Mata Gato em “Os Pastores da Noite” de Jorge Amado; em Macondo a compra de
terras baratas para a construção de redes hoteleiras para turistas, expulsou e
deixou sem terra, sem trabalho e sem dignidade os moradores da cidade fictícia
de Gabriel Garcia Marques, que viraram carne de subemprego e depois viraram carne
de bala de armas de fogo no maior massacre de grevistas da Literatura mundial escrito
em “Cem Anos de Solidão”. Ah, DOR vai dar uma de defensora dos fracos e dos
oprimidos? Esbravejam os raivosos. Não, só não sou cega. E o mais impressionante
é que, tanto na vida real quanto na vida ficcional, a música cantada por todos
que são o lado mais fraco do cabo de guerra das moradias é a mesma, composta
pelo amigo do Hevê Cordovil, do Joca e do Mato Grosso. “Não reclama, porque a
chuva só levou a tua cama...”. Metáfora ótima para os saem “com uma mão atrás e
outra na frente” e vão levantar outra maloca em outro lugar. Viu, Sandro
Dornelles? Eu também tenho meus momentos de ira para com imobiliárias e afins.
Sinta-se homenageado.
Música do Dia: Iracema (Adoniran
Barbosa) https://www.youtube.com/watch?v=wtP3dTexAbE&feature=kp
Bicho do Dia: Abutre (O vilão do Homem
Aranha ou aquele da foto que espera o menininho morrer de fome no Sudão e que
levou o fotógrafo ao suicídio). http://www.jn.pt/PaginaInicial/Media/Interior.aspx?content_id=1789058&page=-1
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