Quase viro abóbora, mas cheguei a tempo.
Parece, quando vejo alguns
comentários, curtidas, likes e coisas do gênero nas redes sociais, que vocês,
humanos, gostam de qualquer merda sem nem ao menos saber o sabor. É como se
fosse o inverso de uma criança que diz “eu não gosto” sem nunca ter comido o
que lhe é oferecido, vocês dizem “eu gosto” sem nem imaginar o gosto da coisa. Eu
tenho visto de tudo ultimamente. Dia desses, eu defendi as marchinhas (até
compus uma) e as marchas de toda ordem. Pensei que não veria nada mais absurdo
que o rei do gado voltando a comer carne, o que também foi tema de um texto meu
em parceria com minha amiga culpa no sábado último. Mas o que vi agora a pouco
me fez cair o cu da bunda. Um rapaz de óculos escuros falando sobre uma marcha
em defesa da família, de deus e do sei lá mais o quê, que eu pensava ser um personagem
desses programas ruins de humor, está sendo levado a sério por um monte de
gente. Fui consultar os alfarrábios da história e vi que sim, lunáticos podem
comandar milhões de pessoas para cometerem atrocidades, assaltos, guerras e até
suicídio coletivo. Minha pesquisa sobre Marchas me levou aos manifestos. Teve
uma época em que tudo que se fazia acabava virando manifesto. Manifesto disso,
manifesto daquilo. Acabou que os manifestos perderam o sentido de ser. Tipo o
roqueiro lobo mau, que criticava as propagandas de iogurte que diziam que tomar
uma atitude era tomar dan’up, e hoje virou caricatura dele mesmo e tudo que ele
critica parece piada de mau gosto. Mas deixemos os lobos maus, os três
porquinhos e os contos da carochinha pra lá. Voltemos ao homem de óculos
escuros e sua marcha da TFP tardia. Meu querido, porque você não vem falar
comigo? Tenho tantas coisas pra dizer no seu ouvidinho. Coisas que os que foram
torturados falaram pra mim, para não abrir o bico para os torturadores. Coisas que
os filhos órfãos dos desaparecidos choraram pra mim. Coisas que as mães dos
assassinados me suplicaram até o último suspiro de vida por não acreditar no
sumiço que deram nos seus filhos. Coisas do arco da velha, meu caro. Ainda dá
tempo. Prometo não chegar de alicates e agulhas embaixo de sua unha, nem de
eletrochoques, muito menos de afogamentos, espancamentos ou cabos de vassoura
no seu ânus. Tire seus óculos escuros e deixe rolar suas lágrimas de arrependimento,
eu prometo ser sutil. Ou volte para o lugar de onde nunca deveria ter saído:
esses programas de humor que pelo baixo nível de qualidade beiram a tristeza.
Música do Dia: Cruel (Luiz Melodia e
Escola de Música da Rocinha) (De: Sérgio Sampaio).
Bicho do Dia: Os Lobos da Marteleti
(Uma homenagem ao amigo dos óio de cão danado).
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