Novas Histórias

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Foto de Ju Vinagre

sábado, 12 de julho de 2014

193º Dia: Me Lambe


Em tempos de fiascos com números que estão mais para cabulosísticos do que pra cabalísticos, de misturas de raças e de cores também por conta do futebol e de outros acontecimentos que tenho narrado aqui, me dou o direito de me abster de mais comentários e abrir o microfone para o meu amigo MEDO, expert em assuntos de ordem variada:
“Findado o festival de virundangas do vexame de que todos falavam – das redes sociais de Sampa às redes antissociais dos pescadores de Itacaré – passei por sete botecos do tipo “copo sujo” e vi um motivo pra me retrair: cansaço. Estava vindo de uma série de compromissos que me tomaram o mês e já não aguentava mais trabalhar. Eu não sou como as minhas amigas divas que mesmo tendo muito trabalho podem esvair-se nas névoas mágicas da indiferença, deleitar-se em lagos mansos de lamúrias, tripudiando da humanidade sem dó, deitadas em travesseiros de pena de ganso: eu sou braçal. Eu sou peão de obra. Eu sou povão. Passei semanas causando frio na barriga dos que precisavam ver o campeonato acabar pra que a vida voltasse ao normal, pra que conseguissem um novo emprego ou dessem continuidade aos seus projetos que foram pausados em virtude da necessidade de comemorar a vitória que não veio. Gastei minhas energias pra que alguns não roessem os dedos na hora de um pênalti, pra que outros não se enfiassem embaixo do viaduto como fez a motorista que puxou o freio do ônibus em Minas. O trampo foi frenético e eu precisava me desligar. Entrei no cinema, o filme não era do Godard, mas era quase. Uma pequena sentou do meu lado e de seu lado o cara sério de camisa amarela com cara séria. Amasso vai, atracamento vem, escuto um “Me lambe!” com sotaque alemão e, em resposta um “Não dá, tenho medo!”. Do que seria o medo? Do lanterninha? Dos contra exploração sexual das brasileiras pelos gringos ou dos a favor da miscigenação? Vieram-me mais seis possibilidades. Fui embora pra felicidade geral. Concluí que o único jeito de repousar a esqueleta era ir pra casa e rezar pra moça lamber, mas não morder.”
Descanso merecido, meu caro amigo MEDO, e creio que entre lambidos e mordidos, estão todos salvos, visto que não precisaram dos meus serviços.
Música do Dia: Mariposa Tecnicolor (Fito Paez).
Bicho do Dia: Cabra (1124).

*Virundangas é um termo da literatura de Guimarâes Rosa e significa "badulakes" usados na indumentária de personagens com transtornos mentais.

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