O Guarda Noturno sempre assobiava suas
cantigas preferidas nas suas solitárias rondas. Era um hábito adquirido desde
criança quando seu pai ouvia as cantigas no radinho de pilha para assoviá-las
depois em suas rondas. Para o homem noturno, os assovios o faziam voltar a ser
criança e a ter a presença do pai por perto, na lembrança. Naquele momento estava se lembrando de um dia
em que seu pai o ensinou a imitar o canto dos pássaros para distrair e enganar
a fome. A fome não aparecia para as crianças que sabiam imitar pássaros, dizia
o pai. E era assim que ele e os irmãos ficavam dias sem comer. Sua irmã mais
nova, Marina, não sabia assoviar direito e era a que mais passava fome e ele
dividia a fome com a irmã para que ela não sofresse tanto. Dos 6 irmãos só
sobraram ele, o futuro guarda noturno, e ela, Marina. Marina, com o tempo, foi
se distanciando do nostálgico Guarda Noturno assobiador, que lamentava, mas
acreditava nos motivos da irmã. Depois de um tempo ela nunca mais deu notícia.
O guarda já estava velinho quando viu nos jornais e revistas que sua irmã,
agora famosa, tinha a maior fábrica de gaiolas do mundo. Marina não tinha só
engaiolado os pássaros cujos cantos tinham lhe ajudado a enganar a fome, Marina
tinha engaiolado seus sonhos. O Guarda Noturno olhou pra Lua de Sangue e
assoviou uma cantiga de esperança.
Música
do Dia: Tio Anastácio (Jayme Caetano Braun) (Dedico essa décima do Grande poeta
payador gaúcho, que contou muito da história dos que até hoje não tem história,
para Marina Silva).
Bicho
do Dia: Avestruz (7804).
Nenhum comentário:
Postar um comentário